Deus usa nossa solidão para Se revelar a nós. Mas temos que deixá-lo agir
Por Mary Beth em 29 de abril de 2004
Uma letra de música antiga dizia: “Vamos nos amar até o final dos tempos, e nunca mais seremos solitários”.
É mesmo? É possível isso? O casamento extermina a solidão? As pessoas casadas realmente nunca são solitárias?
Muitas pessoas solteiras acreditam nisso. E um monte de pessoas anteriormente solteiras que se casaram apenas para escapar da solidão descobriram do jeito mais difícil que isso não é verdade.
A solidão faz parte da condição humana. Todo mundo a experimenta. É claro que as pessoas que vivem isoladas são geralmente mais solitárias do que aquelas que vivem com esposo(a) ou família. Mas não necessariamente. Quem nunca se sentiu solitário mesmo rodeado por uma multidão de pessoas?
Aparentemente João Paulo II entendia a solidão também. (Isso não é surpresa, já que ele por volta dos 20 anos já tinha perdido toda sua família). Ele trata do assunto longamente na sua Teologia do Corpo. E já que todos nós – casados, solteiros, religiosos – experimentamos solidão, penso que seria uma boa idéia pararmos um pouco hoje e vermos o que João Paulo II tem a dizer a respeito.
No livro do Gênesis, Deus criou Adão, “e viu que era muito bom”. Adão é criado à imagem e semelhança de Deus. Toda a criação foi dada como presente a Adão. E ainda assim, a primeira coisa que Deus disse depois de criar Adão foi, “Não é bom que o homem esteja sozinho”. Adão é criado para se entregar, no amor, a outra pessoa humana – e, de fato, não havia pessoa humana para quem Adão se doar.
O Santo Padre diz que Adão estava experimentando a “solidão original”. Ele estava percebendo que era diferente do resto da criação. Ele não tinha só a capacidade de se doar, no amor, a outra pessoa – ele tinha necessidade de se doar. João Paulo II fala de uma “subjetividade pessoal” – Adão precisa existir, não apenas em sua própria vida, mas nas vidas dos outros também.
Mas esse “outro” não podia ser encontrado em lugar nenhum. Adão não podia criar a mulher. Ela será um dom de Deus, e Adão precisa esperar por esse “presente”.
O Santo Padre diz que esperar é importante. A solidão original é importante. Para usar uma frase que não tem nada a ver com teologia, “Você só sente falta da água quando seca o poço”. É somente naquela solidão original que Adão descobre sua capacidade e seu desejo de se doar. Sem essa experiência de solidão, ele não seria capaz de apreciar e valorizar o dom e o presente de uma outra pessoa humana em sua vida.
Eva, é claro, é criada por causa de si mesma, não por causa de Adão. Mas sua presença na vida de Adão é um dom de Deus, assim como a presença de Adão na vida de Eva é um dom. Mas esse dom, esse “presente”, tão bonito, não extingue completamente a solidão original. Adão e Eva continuam se apresentando separadamente diante de Deus, e essa realidade está sempre presente em suas mentes, não importa a intensidade de sua proximidade um com o outro. Aquela outra pessoa não pode e não vai preencher o espaço do coração que está reservado somente para Deus.
Sabe por que eu amo a Teologia do Corpo? Porque nós somos Adão e Eva. Isso tudo se refere a nós.
Então, nossa solidão pode ser boa. Ela nos ajuda a apreciar o dom e a presença dos outros em nossas vidas. Mais importante ainda, nos ajuda a entrar em contato com nossa necessidade de Deus.
Mas isso só acontece se usarmos essa solidão. Se fugimos dela, não há benefício.
Como usar a solidão? Acho que encontramos a resposta para isso nos escritos de Gabrielle Bossis. Ela foi uma mulher francesa – solteira – que em 1930 começou a ouvir mensagens que acreditava serem de Cristo. Essas locuções foram escritas em um livro chamado “Ele e eu”. Quer você acredite que essas mensagens sejam realmente de Cristo ou não, seu conteúdo é maravilhosamente belo. Por exemplo, sobre solidão, Cristo diz:
“Faça tudo – trabalho, orações, pensamentos, fala – como se estivesse ali, e realmente estou ali. Isso não é infinitamente maravilhoso? Quando você acorda, estou ali. Quando você descansa, estou ali. Então você pode dizer, ‘Ele nunca me abandona’. É isso faz sua solidão ser divina” (pg. 96).
Tudo se resume ao seguinte: precisamos ficar sozinhos para perceber que não estamos sozinhos. Quando vivemos em estado de graça, Cristo está presente em nós. Ele não está no céu escutando nossas preces. Ele está bem aqui, do nosso lado. Ele está vivendo conosco cada momento de nossas vidas – nos amando, cuidando de nós. E Ele quer que o reconheçamos, que o amemos, e que possamos falar e compartilhar com Ele nossa vida.
É fácil ver a solidão como um peso. Eu sou testemunha disso. Queremos fugir dela. Fazemos qualquer trabalho, assistimos televisão – qualquer coisa para escapar de nós mesmos e de nossa solidão. Mas estou aprendendo que talvez precise aprender a ir na outra direção – correr para a solidão.
Porque algumas vezes Deus esconde seus melhores dons em lugares inesperados.
Traduzido e adaptado do site: Real Love Inc.