quarta-feira, 15 de abril de 2009

Das trevas para a luz – O testemunho de uma mulher que abortou três vezes

Nessa semana Pascal estou trazendo alguns textos sobre ressurreição, sobre vida que vence a morte. Feliz Páscoa a todos!
Daniel Pinheiro
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Vivi minha vida inteira na escuridão. Perdi meu pai quando tinha 5 anos. Sou a mais nova de seis crianças. Casei jovem, antes de entrar na faculdade, e me mudei para longe de minha mãe, a quem amava muito. Fiquei grávida aos 18 anos, e tive minha primeira criança aos 19 anos. Meu marido era agressivo e violento comigo. O casamento acabou e voltei para a casa da minha mãe. Os problemas estavam só começando. Minha auto-estima estava tão baixa, que comecei a ter relações sexuais com qualquer um.

Em 1979 fiquei grávida e realizei um aborto. Uma amiga me levou para a Planned Parenthood (nota: a maior rede de clínicas de aborto nos Estados Unidos). Lembro-me muito bem de tudo. Podia-se ouvir uma gota d’água caindo no chão, de tão quieto que era. A enfermeira me deu uns papéis para preencher. As únicas coisas que ela me perguntou foram meu nome e se eu tinha como voltar para casa. Fiquei esperando. Não haviam sorrisos, apenas se ouvia algum choro tímido. O lugar era escuro. Pensei comigo mesmo: isso é horrível! Escutei chamarem meu nome. Meu coração começou a bater forte, minhas mãos suando. A enfermeira dizia que o “procedimento” não ia demorar nada, que não iria sentir coisa alguma. "Eles vão te colocar meio adormecida, você não vai sentir nada. Não se preocupe, tudo vai ficar bem, o doutor já fez muitos desses procedimentos". O engraçado é que eles sequer chamavam aquilo de “aborto”, para eles era um “procedimento”. A próxima coisa que lembro era de estar numa cama de metal frio, em uma sala fria. O doutor entrou e disse “não se preocupe, já fiz muitos procedimentos como esse, vai terminar logo, e você poderá voltar à sua vida normal”. Ouvi aquela máquina, o barulho alto, e foi doloroso, ouvia a máquina sugando a vida que estava crescendo dentro de mim. Eu pensei: “bem, eles disseram que não era mais que uma 'bolha de células', que não era um bebê".

Na sala de recuperação, lembro que a enfermeira me perguntou se estava sentindo dor. Eu estava encolhida como uma bola, me balançando para frente e para trás, e sangrando como um porco. Ela disse: “Não se preocupe, querida, isso vai passar em uma ou duas semanas, e então você vai voltar à sua vida normal, como se nada tivesse acontecido”.

Eu continuei com minha vida, cada vez mais fora de controle. Dormia por aí, trabalhava em bares, meu marido agora tinha a guarda da minha filha e vivia em outro estado. Ótimo! Eu tinha que fazer algo, tinha que me restaurar. Tentei voltar com meu marido, mas no fundo do meu coração sabia que não ia dar certo. Fui morar com ele, e as coisas pareciam estar bem, mas um dia deveríamos ter recebido alguns amigos para jantar, e ele ficou com raiva de mim e me puxou pelo colar, o que deixou uma marca no meu pescoço. Estava trabalhando um dia, e quando cheguei em casa as fechaduras estavam mudadas e minha mala estava do lado de fora. Liguei para meu patrão, e ele me arrumou um advogado, e tudo aconteceu muito rápido, minha cabeça estava dando voltas.

Tinha que mostrar para o juiz que tinha condições de ter a guarda da minha filha. Nesse tempo, comecei a usar drogas. Mas, mesmo assim, consegui a custódia dela.

Já em 1981 estava vivendo com outro rapaz, e fiquei grávida de novo. Ele disse que eu tinha que abortar, e me levou para a “Planned Parenthood” local, e esperou por mim do lado de fora. Não pude acreditar que estava passando por tudo de novo. Pensei: “isso não está acontecendo”. De novo, a mesma coisa, quando entrei na clínica, tudo estava quieto, podia-se ouvir um pingo d’água. Alguns sussurros apenas. Ninguém sorria. Eu me sentia horrível! Dessa vez senti a dor do meu aborto ainda mais forte que da primeira vez. O som daquela máquina, sugando meu bebê. Ainda assim deixei que acontecesse. O que havia de errado comigo? Tinha que sair daquela situação, essa pessoa estava controlando minha vida, tomando decisões por mim. Não tinha voz na decisão de ter um bebê ou não. Além do mais, eu me lembrava do que me haviam dito antes: “é apenas um pedaço de tecido”. Eu ficava imaginando se aquilo era verdade. Por que a dor era tão intensa? Por que estava demorando mais? Não tinha nenhuma resposta para essas perguntas. Guardava essas perguntas para mim, e então enterrava no mais profundo de mim mesma essa vergonha, culpa, raiva, frustração, lá naquele lugar escuro dentro de você que ninguém conhece.

Afastei-me desse rapaz e minha filha foi para outro estado. Nessa época as coisas ficaram piores do que antes. Minha vida não passava de sexo, drogas e álcool. Não me importava comigo mesma. Entretanto, me assegurava que minha filha não visse nada disso, não visse esse meu lado. Trabalhei como garçonete. Então conheci outro rapaz. Ele era tão gentil, de boa aparência, e eu pensei: “uau, ele me quer”. Minha auto-estima era praticamente nada, zero. Eu pensei: “ok, porque não?”. Bem, ele se mudou para minha casa e as coisas estavam indo bem. Em 1983, fiquei grávida outra vez. Pensava que esse homem queria uma família, pois ele amava mesmo minha filha, minha filha o amava, então pensei que seria maravilhoso. Mas não foi. Ele não queria um bebê, de modo algum. Eu tinha que abortar. E ponto final! Ele não discutiria mais nada. Estava decidido! No dia seguinte ligamos para a Planned Parenthood e marcamos uma hora.

Ele me deixou na clínica de aborto e disse que voltaria. Eu entrei. “Meu estômago estava todo embrulhado”, eu tinha vontade de vomitar. Até meu corpo me mostrava que não queria passar por aquilo uma outra vez. Meu coração começou a bater acelerado quando cheguei na mesa. A mulher falou para eu preencher alguns papéis, perguntou as mesmas duas perguntas, “qual seu nome, e você tem como voltar para casa?”. Sentei-me aterrorizada pelo que sabia que teria que enfrentar. Pensei: “isso é realmente horrível”! Não tinha com quem falar, ninguém para me falar se essa era a coisa certa, ninguém para me dar opções. Não tinha opções, eu não tinha uma voz. Senti-me tão dormente nessa hora, que tudo que eu conseguia pensar era em passar logo por aquilo. Não queria mais saber daquilo. Eu só queria morrer! Enquanto pensava essas coisas, meu nome foi chamado, e fui levada para a sala. Só que dessa vez me lembro de ter ouvido choro e lamentações. Ficava imaginando o que estava acontecendo. Tinha medo, me sentia paralisada. Sentia como se eu não estivesse ali, passando por tudo de novo. Eu realmente sou um monstro.

Vesti a bata e fui levada para a “sala de procedimentos”. Eles ainda chamavam de “procedimento”, quando na verdade era um aborto. Eles disseram que iriam me fazer sentir relaxada, e que não sentiria nada. “Já ouvi essa história antes”, eu pensei. E dessa vez, senti tudo que aconteceu. Senti o doutor entrando com o tubo e mexendo em mim como se eu fosse um pedaço de carne. Ouvi aquela máquina, a máquina de sugar, era como um aspirador de pó, e senti quando ele colocou aquele tubo dentro de mim. Eu pensava que aquilo é que era dor, mas estava apenas começando. Dessa vez senti a chamada “bolha de células” sendo partida em pedaços. O doutor manteve aquela máquina de sugar em mim por um tempo muito longo. Eu vi estrelas! Aquilo foi muito doloroso. Foi então que percebi que ele estava demorando muito mais do que normalmente deveria. Aparentemente eles não esperavam por isso. Eu só me lembrava de como a dor era intensa, de como queria gritar para o doutor para pedir para ele parar, porque não agüentava mais. Pare. Ele só parou quando o meu bebê todo tinha se ido. Dessa vez estava chorando convulsivamente na cama, e me lembro que não conseguia parar de chorar. Finalmente era a hora de ir para casa e eu saí, e não sentia nada! Estava chorando durante todo o percurso para casa. Cheguei em casa e fui dormir, e chorei até adormecer. Sentia-me vazia, não tinha mais nada, pensei. Estava tão repleta de culpa que não sabia o que fazer. Bem, eu e esse rapaz finalmente terminamos.

Sentia um vazio dentro de mim. Não podia entender porque chorava toda vez que via comerciais com bebês na televisão, ou porque invejava outras mães caminhando com seus bebês. Eu amava crianças, tinha crescido rodeada de irmãos. Que tipo de mulher eu era. Não era boa, eu pensava. Estava tão envergonhada do que tinha feito, que não queria que ninguém soubesse de meus segredos. Mantive-os escondidos por 29 anos. Passei tempos horríveis. Estava com depressão, não sabia o que fazer comigo mesma. Fui pelo mesmo caminho, no sexo, sem me importar comigo mesma, com o que era; não tinha auto-estima, eu era somente aquele vazio. Era como estar em uma caverna, escura, sozinha, com medo.

Até que em 1999 me casei com um homem maravilhoso e me tornei Católica, e minha vida mudou. Não foi de uma vez, foi gradual. Deus tinha planos para mim, mas eu não sabia na época. Estava na Igreja em uma tarde de fevereiro quando conheci uma mulher que se tornou meu verdadeiro anjo da guarda. Ela me apresentou a um maravilhoso padre chamado John McFadden.

Em 15 de outubro de 2004 fui a uma palestra sobre aborto, que tinha o título de “Pelas Suas chagas sereis curados”. Como Deus é maravilhoso, e como me senti abençoada! Assisti a palestra e confessei toda a minha vida para o Pe. McFadden. Aprendi sobre a Adoração ao Santíssimo Sacramento, e me falaram para ficar um pouco com Jesus para que eu pudesse descobrir o sexo de minhas crianças. Descobri que tinha tido um filho, cujo nome é Mateus, outro filho cujo nome é Thomas, e uma filha cujo nome é Katherine. Jesus me falou que deu esses nomes a eles por causa de grandes santos. Durante esse final de semana fiz pela primeira vez a leitura na Missa. Também fui instruída a participar de um retiro na “Rachel’s Vineyard”.

Em 11 de março de 2005 fui para o retiro. Não posso dizer como foi maravilhoso. Mudou minha vida. Foi uma jornada difícil, mas eu não estava sozinha. Estava perdoada de tudo por que tinha passado na vida. Eu, essa enorme pecadora, que escolheu dar fim à vida de três crianças, que fez tudo que se pode fazer debaixo do sol, tinha recebido a graça da cura, verdadeiramente um milagre abençoado. Não estava mais nessa caverna escura e profunda, não estava mais repleta de vergonha e culpa. Não era mais a mulher de antes. Deus, através do ministério de “Rachel’s Vineyard”, me abençoou e me mostrou que eu sou Sua filha, filha de Deus, filha da Luz. Jesus disse: “Eu sou o caminho, a verdade e a vida”. Quem come da minha carne não terá mais fome, e quem bebe do meu sangue não terá mais sede. Venham a mim todos os que estais cansados, e eu vos darei alívio.

A alegria que sinto agora, sendo uma filha de Deus, é maravilhosa. Não deixarei mais que a escuridão tome conta de mim, como no passado. Deus perdoou meus pecados, Ele deu a vida por mim. Fiz uma promessa a Jesus, e falei para Ele que meus filhos teriam uma voz, que eles não ficariam mais em silêncio. Louvor e Glória a Ti, Senhor Jesus, por me dizer: “Nem eu te condeno”!

Que a paz do Senhor Jesus esteja como todos vocês. Deus os abençoe.

Victoria

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Tradução do testemunho disponível em http://www.rachelsvineyard.org/emotions/stories.aspx

Extraído do site Rachel’s Vineyard, que é um projeto que acolhe mulheres (e homens) que se envolveram com aborto, fornecendo suporte emocional e espiritual.

http://www.rachelsvineyard.org

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