quinta-feira, 16 de março de 2017

Morrre Norma McCorvey

Por Pe. Luiz Carlos Lodi da Cruz

Disponível em: http://www.providaanapolis.org.br/index.php/todos-os-artigos/item/538-morre-norma-mccorvey

(com uma falsa alegação de estupro, ela obteve a liberação do aborto nos Estados Unidos)

No dia 18 de fevereiro deste ano, Pe. Frank Pavone, Diretor Nacional de “Priests for Life” (“Sacerdotes pela vida”), noticiava em um e-mail a morte de sua amiga Norma McCorvey, aos 69 anos de idade.


Conhecida como Jane Roe, Norma tinha 21 anos quando em 1969 descobriu que estava grávida de seu terceiro filho. Desejosa de fazer um aborto na cidade de Dallas, Texas, EUA, inventou a história de que havia sido estuprada por uma gangue. Então duas advogadas recém-graduadas, Linda Coffee e Sarah Weddington, que estavam à procura de uma mulher grávida desejosa de abortar, ofereceram-se para representá-la em juízo contra o Estado do Texas (cuja legislação proibia seu aborto), representado por Henry Wade, procurador do Condado de Dallas.

Em 1970 estava criado o caso “Roe versus Wade”, que subiria até a Suprema Corte e resultaria na tristemente célebre sentença de 22 de janeiro de 1973, dando vitória a Roe por sete votos contra dois. Norma não fez aborto. Antes que o processo encerrasse, ela deu à luz e encaminhou a criança para adoção. Mas foi por causa dela (e da mentira por ela inventada) que a Suprema Corte declarou inconstitucional a legislação do Texas que incriminava o aborto. E foi mais adiante:

Afirmou, de fato, que qualquer lei estadual que proibisse o aborto para proteger o feto nos primeiros dois trimestres de gravidez - antes do sétimo mês - era inconstitucional. (...) De um só golpe, em Washington, um tribunal de nove juízes que haviam sido nomeados e não eleitos para seus cargos, e que nem foram unânimes em sua decisão, mudara radicalmente as leis de quase todos os cinquenta estados norte-americanos[1].

A decisão fundou-se, por um lado, no direito da mulher à “privacidade”, por outro lado, na negação da personalidade da criança por nascer. Para declarar que o nascituro (unborn) não era pessoa, e que, portanto, não tinha direito à vida, a Suprema Corte usou o mesmo texto da emenda que outrora havia proibido a escravidão. Dizia tal emenda que “... todas as pessoas, nascidas ou naturalizadas nos Estados Unidos (...) são cidadãos dos Estados Unidos...” (destacou-se). Ora, como o nascituro não é nascido nem naturalizado, então ele não é cidadão dos Estados Unidos. Assim, ele não goza de nenhum direito! Por meio desse artifício, o Tribunal declarou que a personalidade legal não existe nos Estados Unidos antes do nascimento: “... a palavra ‘pessoa’, como foi usada na 14ª Emenda, não inclui o nascituro.”[2]

Além de declarar inconstitucional qualquer lei estadual, como a do Texas, que proibisse o aborto inclusive até o sexto mês de gravidez, a Suprema Corte declarou que o aborto poderia ser permitido até o momento do nascimento, desde que o médico o julgasse necessário para preservar a saúde da mãe. O conceito de saúde foi estendido ao extremo, compreendendo o completo bem-estar físico e psicológico da gestante. Acerca disso, transcreva-se o voto do juiz relator Blackmun:

A maternidade, ou uma prole adicional, pode forçar a mulher a uma vida e a um futuro angustiados. O dano psicológico pode ser iminente. A saúde física e mental pode ser sobrecarregada pelo cuidado do filho. Há ainda a angústia, para todos os envolvidos, associada ao filho indesejado, e há o problema de trazer uma criança a uma família já incapaz, psicologicamente e por outros motivos, de cuidar dela. Em outros casos, como neste [o de Jane Roe], as dificuldades adicionais e o contínuo estigma de mãe solteira podem estar envolvidos. Tudo isso são fatores que a mulher e seu médico responsável necessariamente levarão em conta na consulta.[3] (destacou-se).

Com esse conceito tão amplo de “saúde”, a partir de 1973 qualquer mulher estadunidense pôde abortar simplesmente por alegar que a gravidez, sendo indesejada, causava-lhe um mal-estar psicológico, e assim, prejudicava a sua “saúde” psíquica. Estava liberado na prática o aborto por simples solicitação da gestante: o aborto a pedido (abortion on demand).

Falso estupro revelado

Em 1987, Norma McCorvey reconheceu, em entrevista televisiva com Carl Rowan, que a história do estupro tinha sido completamente inverídica[4].

Sarah Weddington, uma das advogadas de Roe versus Wade, explicou em um discurso feito no Instituto de Ética da Educação, em Oklahoma, por que se utilizara da falsa alegação de estupro até que o caso chegasse à Suprema Corte: “Minha conduta pode não ter sido totalmente ética. Mas eu fiz por que pensei que havia boas razões”[5].

Norma tornou-se um ícone do movimento pró-aborto (chamado “pro-choice”, que significa “pró-escolha”) e passou a trabalhar na indústria do aborto.

Conversão à vida

Sua conversão ocorreu quando a Operação Resgate (um grupo pró-vida que atua nas portas das clínicas de aborto) mudou-se para um prédio do outro lado da rua da clínica onde ela trabalhava, em Dallas. Inicialmente ela reagiu com violência, mas pouco a pouco passou a sentir simpatia pelos militantes pró-vida.

Em 8 de agosto de 1995, Norma McCorvey foi batizada pelo Pastor Flip Benham, Diretor Nacional da Operação Resgate[6]. No entanto, ela ainda se dizia favorável ao aborto no primeiro trimestre de gestação. Ouçamo-la em seu livro “Won by love” (1998) (“Vencida pelo amor”) dizer o que aconteceu:

Poucas semanas depois da minha conversão, eu estava sentada no escritório da Operação Resgate, quando notei um cartaz de desenvolvimento fetal. A progressão era tão óbvia, os olhos eram tão doces. Meu coração se feriu, somente de olhá-los.
Corri para fora e finalmente despertei: “Norma,” disse a mim mesma, “eles estão certos”. Eu tinha trabalhado com mulheres grávidas por anos. Eu mesma tinha passado por três gravidezes e três partos. Eu deveria ter sabido. Algo ainda no cartaz fez-me perder a respiração. Continuei olhando a figura daquele minúsculo embrião de dez semanas, e disse a mim mesma: aquilo é um bebê!
Foi como se antolhos caíssem de meus olhos e de repente eu compreendi a verdade: aquilo é um bebê!
Senti-me “esmagada” pela verdade daquela percepção. Tive que enfrentar a terrível realidade. O aborto não era de ‘produtos da concepção’. Não era de ‘menstruações perdidas’. Era de crianças sendo mortas no ventre de suas mães. Durante todos aqueles anos eu estava errada. Ao assinar aquele depoimento, eu estava errada. Ao trabalhar em clínicas de aborto, eu estava errada. Não mais essa coisa de primeiro semestre, segundo trimestre, terceiro trimestre. O aborto – em qualquer ponto – era errado. Era tão claro. Dolorosamente claro[7].

Em 27 de agosto de 1998, Norma ingressaria na Igreja Católica, recebendo a Comunhão Eucarística e a Confirmação, esta última administrada pelo Pe. Frank Pavone[8].

Em um vídeo de um minuto produzido em 2013, Norma McCorvey dizia: “Depois de conhecer a Deus, eu percebi que o meu caso [Roe versus Wade], que legalizou o aborto a pedido, foi o maior engano da minha vida”[9].

Leiamos o que escreveu Pe. Frank Pavone na mensagem em que noticiava a morte de sua amiga:

Apesar do peso em seu coração pelo assassinato de 58 milhões de crianças desde a sentença Roe versus Wade, ela sempre soube como tomar a mão do Senhor e deixar sua graça levantá-la. Ela experimentou o programa do retiro das Vinhas de Raquel[10] para ajudá-la a sarar suas feridas (embora ela mesma nunca tenha feito um aborto), e dedicou-se de todas as maneiras a pôr um fim à tragédia do aborto.

Amigos, a história de Norma continuará viva. É uma história de esperança. Se ela pôde se converter e encontrar perdão por seu envolvimento com o aborto, então qualquer um pode. E se ela pudesse dizer alguma coisa agora para o mundo, estou convencido de que seria: “Aprendam minha história e tenham esperança”.

Anápolis, 13 de março de 2017.
Pe. Luiz Carlos Lodi da Cruz
Presidente do Pró-Vida de Anápolis


[1] Ronald DWORKIN. Domínio da vida, São Paulo: Martins Fontes, 2003. p. 7.
[2] UNITED STATES OF AMÉRICA. Supreme Court. Roe v. Wade. Appeal from the United States District Court to the Northern District of Texas. BLACKMUN, J., Opinion of the Court, 22 Jan. 1973, Washington, DC. Disponível em: https://www.law.cornell.edu/supremecourt/text/410/113
[3] Ibidem.
[6] Cf. Steven WALDMAN; Ginny CARROL, Roe v. Roe. Newsweek, New York, 21 Aug. 1995, p. 24.

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